REFLEXÕES SOBRE HIPNOSE
Desde que
iniciei meus estudos em hipnose e hipnoterapia, verifiquei que existe um
movimento natural no ser humano de mitificar, tornar fabuloso ou inacreditável,
mistificar, tornar sobrenatural ou dar um sentido oculto, tudo aquilo que não
compreende e em virtude disso a maioria das ciências, em seu estado germinativo,
passou por momentos de incredulidade ou mitificação, haja vista o exemplo de
Galileu Galilei que quase foi queimado na fogueira por afirmar que a terra era
redonda, e esse também foram e são o caso da hipnose, ora mitificada, ora
mistificada, ora desacreditada. E o maior agravante que reforça estes aspectos,
vem sendo a utilização da hipnose para shows, no seu início em praças públicas
e atualmente em programas televisivos, foi também muito utilizada em filmes de
ficção científica para lavagens cerebrais e atuação em espionagens,
surpreendendo o telespectador mais ingênuo e sendo banalizada pelos mais
céticos.
Considera-se
o início do estudo científico da hipnose, numa tentativa de transformá-la em
ciência a fim de sua utilização na cura de doenças, a partir de 1760 e este
estudo vem se desenvolvendo e está em evolução até os dias atuais. A hipnose
não difere de nenhuma outra ciência, seus méritos e deméritos estão
estreitamente ligados à lisura e bom senso do profissional que dela se utiliza.
Sob
meu olhar, o que tem urgência em ser clareado é o fato de se atribuir um poder
ao hipnotizador sobrepujante à condição humana. O único “poder” que ele tem a
mais é ter estudado e aprendido a hipnose e qualquer outra coisa que daí
resulte, está na mente fantasiosa do hipnotizador e de quem observa ou se
submete ao transe hipnótico.
Outro
ponto importante a ser esclarecido é que somente 25% das pessoas são
suscetíveis à hipnose de palco e mesmo assim todas dispõem de mecanismos
internos de defesa que protegem o subconsciente de sugestões hipnóticas que
possam lhes causar prejuízos. Falando de outra maneira, só estão sujeitos ao
comando hipnótico aqueles que aceitam estes comandos, portanto, se o
hipnotizado não o quiser não reage a qualquer sugestão que lhe seja dada pelo
hipnotizador.
Diante
desta colocação pode ficar uma grande interrogação... Então só 25% das pessoas
podem se beneficiar de tratamentos com hipnose? Não, não e não. Profissionais
que se interessam em utilizar essa técnica, para ajudar as pessoas a resolverem
problemas que as impeçam de viver uma vida saudável, dispõem de técnicas que
atingem 100% de seus clientes, desde que não sejam psicóticos ou estejam sob efeito de drogas e ou bebidas alcoólicas.
A
hipnose também não é uma panaceia. Sua eficácia se baseia no fato de ativar,
através do transe, o sistema nervoso parassimpático que se ocupa das funções
restauradoras e da armazenagem de recursos que possam ser necessários para
lidar com situações difíceis. Eis aqui uma informação importante para
desmistificar a hipnose. Em suma, “transe hipnótico é uma alteração neurológica
temporária produzida por causas naturais identificáveis..., há evidências de
que o estado de transe, desde que seja positivo, pode ter propriedades
curativas em si e por si mesmo”.
Um
dos precursores da hipnose foi Emile Coué que com seu trabalho e ensinamentos
nos trouxe o conhecimento dos princípios científicos que governam a
sugestionabilidade, ele mesmo resumiu sua teoria em duas conclusões:
1-
Cada ideia que ocupa exclusivamente a mente é transformada num verdadeiro
estado físico ou mental;
2-
Os esforços que fazemos para refrear uma ideia pela aplicação da vontade apenas
servem para tornar essa ideia mais poderosa.
Sintetizando: as
pessoas são sugestionadas ou autossugestionadas para adquirir uma doença e
podem ser sugestionadas para se livrar delas.
Abade Faria
(1766-1819), um frade português, também um estudioso da hipnose traduzia essa
teoria da seguinte forma: “Uma pessoa pode ser enfeitiçada para adoecer e pode
ser enfeitiçada para sarar”.
Não existe aqui a
intenção de se afirmar que todas as doenças são sugestões, pois tal fato seria
leviano e negligenciaria todos os esforços, de séculos, desenvolvidos pela
medicina na busca de compreender e buscar a cura para as moléstias humanas.
Mesmo porque um dos maiores problemas, senão o maior em relação à doença, é que
está sempre acompanhada por problemas emocionais. Não importa - uma questão
muito discutida nas rodas acadêmicas - se são as emoções que provocam as
doenças ou se as doenças é que desencadeia emoções, o que importa é que ambas,
doenças e emoções, são pares constantes neste processo. Assim sendo, sempre que
uma manifestação física aparece não podemos esquecer que tem como parceira uma
emoção ou um problema emocional que também precisa ser sanado, caso contrário a
“cura” não será definitiva, podendo acontecer de o sintoma tratado desaparecer
momentaneamente ou deslocar-se para outros focos físicos.
Por crer nisso,
aponto a hipnose como mais um recurso que pode ser integrado num tratamento
multidisciplinar objetivando buscar o equilíbrio do binômio mente/corpo.
Além disso, é
bastante produtiva em auxiliar as pessoas a buscarem seus recursos internos
para sanar dificuldades de várias ordens e desenvolverem uma vida melhor e mais
harmoniosa.
Vera Lucia
Salles
(Este artigo foi publicado nas Revistas São Paulo II e 39Mais, no mês de junho/2013)